quinta-feira, outubro 15, 2009

Dona Maitê ligou

Muito se tem falado de dona Maitê Proença. O vídeo que todos vimos nos media não me irritou como parece ter irritado a maioria dos portugueses. Afinal de contas, cada um que tem o sentido de humor que tem e a piada de Maitê, a avaliar pelo seu pedido de desculpas, é vitíma da (momentânea?) falta de qualidade do seu. Não é o facto de ela dizer que os portugueses são esquisitos ou burros até porque, e sejamos justos, a maior parte dos portugueses são burros e esquisitos tal como a maior parte de qualquer povo de qualquer país do mundo. As idiossincrasias menos boas de um povo é um excelente motivo para fazer piada e eu rio-me a bandeiras despregadas com isso quando feito pelos Gato Fedorento ou pelos Contemporãneos e raramente acho piada alguma quando feito no Telerural ou nos espectáculos mais revisteiros, por exemplo.
Fazer comédia é hiperbolizar os aspectos jocosos e ridículos. Ora, aos meus olhos, Maitê Proença expôs ao ridículo o provincianismo recalcado e infundado com que alguns brasileiros olham para os portugueses. Uma espécie de trauma nacional que alguns brasileiros teimam em não ultrapassar por terem sido colonizados por Portugal, embora sejam agora um gigante mundial. No fundo é um preconceito, a acção é perpétua e o porquê é muitas vezes desconhecido. Nada de grave portanto, que todos os preconceitos tivessem por face mais visível a gargalhada, éramos todos muito mais felizes. A que conclusão posso chegar? Maitê Proença é fraca a fazer graça ou é fraca de espírito? A resposta obtive-a nos primeiros poucos segundos de um excerto de um video da própria Maitê transmitido na televisão portuguesa, no qual mais do que pedir desculpa (algo a que de facto não era obrigada), Maitê se desculpa. A actriz brasileira começa por dizer que "O brasileiro é muito brincalhão". Ora cá está tudo explicadinho e posto em pratos limpos. Segundo Maitê, o brasileiro, por oposição ao português, tem sentido de humor. Se dúvidas havia está exposto o sentimento de superioridade de que já tinha sido acusada a sua comédia. Aliás, segundo o dicionário da língua portuguesa e sendo, então, dirigido aos portugueses, o vídeo da polémica (sem dúvida exagerada, embora eu continue a alimentá-la) parece estar mais próximo da definição de escárnio do que de comédia. E deixem-me lembrar-vos que um dos sinónimos de escárnio é "menosprezo". Maitê continua e dá-nos uma lição sobre o sentido de humor brasileiro. Vamos lá compará-lo ao sentido de humor Português?
Maitê diz:

"A gente brinca com o nosso presidente..." - Confere.
"...com a falta de formação académica do nosso presidente..." - Nós brincamos sobre o diploma de José Sócrates.
"...a gente brinca com a própria tragédia..." - Pelo amor de Deus, mas que país não-comunista, não-fascista e não-muçulmano não o faz?
"...com o baiano que é indolente, com o menino que é introspectivo, com o paulista que é stressado, com o carioca que é malandro." - Nós também brincamos com o alentejano que é malandro, com o nortenho que ferve em pouca água, com o urbano que só pensa em trabalho e com o brasileiro que é ladrão.

A celebridade termina a sua defesa dizendo que os brasileiros brincam com aquilo pelo que sentem "afecto". O problema de Maitê parece ser então a falta de capacidade de amar. Se de facto sente afecto por Portugal devia-nos estudar melhor e perceber um pouco mais o nosso sentido de humor. Porque se aquele vídeo chega para fazer rir todos brasileiros, dos quais se socorreu na sua desculpa (algo em que manifestamente não acredito), parece-me pouco sofisticado para fazer rir algum do público português que se vai habituando a bom humor.
Acho a rábula fraca pois se o intuito era gozar com os portugueses devia pegar em aspectos característicos nossos e caricaturizá-los. O que vi foi uma rábula sobre uma turista que nada sabia de Portugal, que não percebeu o 3 invertido referente à maçonaria e confundiu o Tejo com o Atlântico, e vi outra rábula sobre um mau profissional de informática que poderia ser sobre qualquer profissional de qualquer ramo em qualquer país. Este último episódio parece um forcing para fazer rir às custas dos portugueses, sem que haja qualquer contexto que explique a sua necessidade, algo que pode ter-nos sido induzido pela montagem da reportagem jornalística em que o vimos. Aliás é bom não esquecer que estas imagens devem ser consideradas num contexto em que quase todos os portugueses desconhecem, a emissão em questão do programa Saia Justa.
Apesar de tanta indignação, acho que o mesmo registo faria rir muitos mais tugas caso não fossem eles, aparentemente, o objecto cómico. Este episódio é bom para pensarmos um pouco no que realmente nos faz rir e o que diz isso sobre nós. Enquanto episódio diplomático, faço zapping como se fosse mais uma emissão do Preço Certo. A única pessoa que pode sair lesada de tudo isto é a própria autora que pode ter perdido popularidade em Portugal. Ao contrário de mim, haverá muita gente que considerará um ataque pessoal. Eu sinceramente só acho que a senhora poderia ter pensado duas vezes antes de fazer um pedido de desculpa oficial à pressa que deu uma pobre imagem dela própria.
Aos portugueses que se sentem ofendidos pelo primeiro vídeo e não pela desculpa apresentada, ou que pensam que todos os brasileiros acham graça a qualquer piada sobre portugueses independentemente da sua qualidade, só vos tenho a dizer que vocês ainda têm menos graça do que o vídeo de Maitê Proença. E a toda a gente que viu na cuspidela (momento mais sexy do vídeo) um acto de vandalismo ou a representação de desrespeito pelo nosso país, citaria Joe Berardo: "Fuck You". É preciso ser-se muito mal intencionado para ver tais intenções num gesto claramente irreflectido.
No fim de contas o que nos arrelia é não conseguir discernir as intenções da Maitê-pessoa, uma vez que a Maitê-persona sai prejudicada. O facto do vídeo ter um formato amador e parecer ser "autêntico" ainda maior confusão nos faz, mas esta dicotomia pessoa/persona é o que nos fascina e o que sustenta o circo de celebridades. Neste momento, e para equilibrar o barómetro, é a própria Maitê que nos lembra de um vídeo em que participa com os Gato Fedorento num sketch que é um divertido jogo de espelhos entre traços cómicos das duas culturas. Ora digam lá que ela não está fantástica nesse vídeo.

Maitê, I steel love you, mas deixa-te estar caladinha uns tempos.


2 comentários:

Bruma disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Bruma disse...

Finalmente alguém que partilha a minha opinião! Não percebo a polémica toda. É um video sem graça, feito por uma pessoa burra. Devia dar pena, no máximo, não revolta.

Agora, para algo completamente diferente: "I steel love you"???